Chegando na equipe Aurinegra, o brasileiro nos contou um pouco do seu dia a dia em Dortmund, o sentimento para a nova fase na vida pessoal e o ambiente no novo clube
Marcelo Martins (Foto/Reprodução - Borussia Dortmund GmbH & Co. KGaA, .Rheinlanddamm 207-209.44137 Dortmund) |
Nascido no Rio de Janeiro, criado em Brasília, com passagem pelos quatro cantos do mundo e atualmente trabalhando em um dos principais clubes da Europa. Estamos falando de Marcelo Lins Martins, um dos preparadores físico do Borussia Dortmund a partir da atual temporada, 2023/24.
Nesta entrevista exclusiva concedida ao Fussball Brasil, o preparador físico de 50 anos contou parte de sua trajetória no mundo desportivo e como se sente no novo ambiente, regressando à Alemanha, onde teve sua primeira passagem de 2008 a 2013, trabalhando inicialmente na equipe do FC Bayern de Munique, chegando na época para cooperar junto com Jürgen Klinsmann.
Depois de realizar trabalhos em categorias de base pelo Brasil, o brasileiro se juntou à Athletes Perfomance, uma empresa norte-americana voltada para o trabalho de aumento de perfomance de atletas de diversos esportes, atualmente chamada de Exos, através desta companhia Marcelo também trabalhou por dois anos na extinta extensão do Chivas Guadalajara (México), o Chivas-USA.
Posteriormente, rumou para o Catar para trabalhar com o seleção nacional do país do Oriente Médio, ficando por dois anos lá até chegar em Munique em 2008. No período que esteve na Baviera, trabalhou com grandes treinadores: Jürgen Klinsmann, Louis van Gaal, Andries Jonker (interino na época) e Jupp Heynckes, participando de importantes conquistas do FCB: Bundesliga (2009/10 e 2012/13), DFB-Pokal (2009/10 e 2012/13), DFL-Supercup (2010/11 e 2012/13) e UEFA Champions League (2012/13), Marcelo deixou o Rekordmeister justamente no ano que o clube conquistou a Tríplice Coroa, que inclusive derrotou o Borussia Dortmund na final da UCL por 2 a 1, em Wembley, na Inglaterra.
Marcelo voltou ao Brasil por questões familiares e depois rumou para os Estados Unidos para novamente trabalhar ao lado do lendário ex-jogador alemão, Jürgen Klinsmann, sendo parte do staff que preparou a seleção norte-americana para a Copa do Mundo de 2014, no Brasil. Em 2015, o preparador físico ingressou Athletico-PR (Ficando até 2018) e também exerceu trabalhos com a Seleção Olímpica dos Estados Unidos.
Em 2018/19, chegou na Oceania para trabalhar no Western Sydney Wanderers, da Austrália, por onde ficou só uma temporada. De novo voltando para o país natal, Marcelo teve uma passagem pelo CSA, de Alagoas, em 2019, para além de ministrar aulas através da Licença A da CBF Academy (ocorrente de 2016 até 2021), assim como também tinha feito uma efêmera consultoria no EC Bahia em anos anteriores.
Novamente na Europa, Marcelo chegou no Antalyaspor, da Turquia, e por lá trabalhou ao lado de um dos grandes jogadores da história do Borussia Dortmund, Nuri Şahin, que treina o clube desde outubro de 2021, encerrando a carreira previamente quando surgiu a oportunidade de ser o treinador do clube turco.
Enquanto trabalhava na Turquia, o brasileiro recebeu uma proposta do Borussia Dortmund para trabalhar na equipe chefiada por Shad Forsythe, que já conhecia Marcelo de longa data e fez o convite para que Marcelo voltasse a trabalhar no futebol alemão.
Sébastien Haller e Marcelo Lins Martins (Foto: Borussia Dortmund GmbH & Co. KGaA, .Rheinlanddamm 207-209.44137 Dortmund) |
CONFIRA ABAIXO A ENTREVISTA COMPLETA COM MARCELO LINS MARTINS
Pergunta - Jonathan Gonçalves/Fussbal Brasil: Como tem sido a adaptação ao Borussia Dortmund?
R: Tem sido bom. É um clube muito família. Fui muito bem recebido. Eu vim pra cá a convite do Shad (Coordenador de Perfomance), eu achei uma boa oportunidade pra mim e pra família, sendo um contrato de mais de um ano, de poder ter um pouco mais de estabilidade e a oportunidade de estar numa das melhores ligas do mundo. Eu gostei das experiências que tive aqui (Alemanha) antes. A minha esposa morou por 15 anos na Alemanha e tinha vontade de voltar. Então foi uma coisa que acabou dando certo e casando com os nossos objetivos."
Pergunta - Você sente que no ambiente ainda rola frustração pelo título perdido na última temporada?
R: Foi uma derrota pesada para todo mundo. Não só para os jogadores, para o clube, para a cidade inteira. Não foi uma coisa fácil, porque estava nas mãos do Dortmund de poder quebrar a hegemonia do FC Bayern, de voltar a ser campeão alemão novamente. Realmente, foi uma frustração muito grande. Não dá pra dizer que eu sinto isso no ambiente (frustração), lógico, conversando com as pessoas foi isso foi um momento difícil, mas que passou. Talvez, até dê mais força e ânimo para a nova temporada. Acontece no futebol. É bola pra frente, cabeça na nova temporada, querer dar o melhor, querer dar o melhor e ver no que vai dar."
Pergunta - Como é a sua relação com o técnico Edin Terzic?
Marcelo Lins Martins junto com Edin Terzic (Foto:Borussia Dortmund GmbH & Co. KGaA, .Rheinlanddamm 207-209.44137 Dortmund) |
R: "O meu relacionamento com o Edin é muito bom. Quando eu estava no Brasil ele me ligou para dar as boas-vindas e me deixar bem a vontade. Disse que o que eu precisasse poderia entrar em contato com ele. Então já foi uma primeira impressão foi muito boa. Ele não vai na academia quando os jogadores estão fazendo trabalho pré ou pós-treino, mas no campo ele tem o contato com o Shad Forsythe e o fisiologista, do que necessariamente comigo. Eu às vezes bato um papo com ele, até mais informal, às vezes ele me pergunta algumas coisas também, mas geralmente esse primeiro contato é feito com o Shad e o fisiologista."
Pergunta - Você consegue notar grandes diferenças das instalações do FC Bayern para as instalações do Borussia Dortmund?
R: "Pra te falar a verdade, não! Logicamente que, eu estive lá há mais de 10 anos, então já não deve ser a mesma coisa. Mas de como era lá e como vejo tudo por aqui, não vejo muita diferença. A estrutura é muita parecida, é muito similar. Por exemplo, no Brasil eu pude trabalhar no Ahtletico-PR e lá eles possuem uma estrutura excelente no que se diz respeito a espaço físico. Na Alemanha, muitos clubes possuem uma estrutura mais enxuta, mais otimizada, funcional, bem equipadas e organizadas. No BVB os diversos departamentos são próximos e trabalham de forma integrada. O refeitório - que eu achei excepcional com uma cozinha de conceito aberta que passa uma sensação de casa, de família, com um ambiente acolhedor e com os chefes de cozinha de alta qualidade. Também muito parecido com o FC Bayern."
Pergunta - Quais são os aspectos que você e todo o staff concentra para evitar lesões?
R: "Lesão é multifatorial. Muitas vezes falar exatamente o que causa a lesão ou o que causou não é uma coisa tão simples. São muitos fatores que podem gerar ou aumentar a probabilidade para que uma lesão aconteça e na maioria das vezes ocorre por uma combinação de fatores. O fator de risco número um é o histórico de lesões do jogador.... é difícil contratar um jogador com um histórico grande de lesões e esperar que ele não se lesione durante a temporada... mas com certeza são jogadores que precisam de uma atenção maior, de acompanhamentos mais individualizados. Um exemplo é o Julien Duraville, um jovem talento mas já com um histórico de lesões considerável para a idade dele. Ou o Jamie Bynoe-Gittens que possui um problema crônico nos dois ombros que o tiraram por tempo considerável dos gramados. Alguns outros exemplos são o Felix Nmecha e Marcel Sabitzer que não chegaram 100% devido a problemas físicos. Aqui na Alemanha, as pré-temporadas são de cinco a seis semanas, tempo suficiente para se construir uma boa base pra temporada (logicamente dependendo do estado que o jogador retorna das férias). Mas existem situações atípicas e que dificultam uma boa preparação. Por exemplo, no primeiro jogo oficial (vs. 1. FC Köln) apenas dois jogadores que estavam em campo fizeram toda a pré-temporada, a maioria dos que estavam em campo foram jogadores que chegaram depois pois estavam com suas respectivas seleções e tiveram poucos dias de treino antes da viagem para os EUA. Lá quase não se treinou, foram três jogos em três cidades diferentes além das 9h de diferença de horário em relação à Alemanha. Pra esses jogadores foi uma pré-temporada bem curta como vemos muitas vezes no Brasil. Uma série de testes é feita no início da temporada na pré-temporada pra avaliar. A situação dos jogadores no retorno das férias e outros testes de monitoramento são feitos regularmente para tentar entender a resposta dos jogadores as cargas de treino. São feitas reuniões diárias onde os médicos, fisioterapeutas, fisiologista, nutricionista e preparação física discutem individualmente as questões de cada jogador. Uma coisa que já escutei é que no último ano houverem menos lesões do que ano retrasado. E que no ano retrasado as coisas por aqui não funcionavam bem. Ano passado houveram mudanças nas diretrizes da preparação física e isso continua esse ano mas tudo dentro de um processo que as vezes leva tempo pra se chegar ao objetivo final."
Pergunta - Como você vê e lida com o Marco Reus, por exemplo?
R: "É um cara que já está no BVB há muito tempo, é um ídolo. Não conhecia ele pessoalmente antes, mas ele é um veterano que agrega para o clube, agrega para o time com a sua experiência. Já tem uma certa idade, o tratamento tem que ser um pouco diferenciado no quesito quantidade de jogos, no quesito de recuperação e carga de treinamentos. Mas tenho me surpreendido com a vontade que ele demonstra, tenho visto ele fazendo a parte dele. Ele vai antes na academia, ele treina, depois se tiver que fazer mais trabalhos, ele faz. E dizem que antes ele não era tão "aberto" aos exercícios extracampo, mas agora vê a importância de trabalhos mais direcionados as suas necessidades."
Pergunta - Como é feito o cronograma do pós-jogo?
R: "Isso é relativo. Depende do decorrer da semana. Se tem uma semana cheia, com dois jogos ou três. Normalmente, com a semana cheia, você tem o jogo, no dia seguinte treina e no dia seguinte é folga. Muitas das vezes, os atletas pós-jogo ainda fazem trabalhos de força de membros inferiores ainda no estádio, como algumas corridas no campo. No dia seguinte, tem o trabalho recuperativo e quem não jogou ou entrou na partida por curto tempo, tem o treino no campo."
Pergunta - Como foi trabalhar com o Nuri e a saída para o Borussia Dortmund?
R: "A minha experiência com o Nuri foi muito boa. É um cara do bem, muito 'bacana', inteligente, ele vive futebol. Foi muito bom poder conhecê-lo e ter vivido com ele durante o tempo que estive no Antalyaspor. Quando recebi o convite do Dortmund, eu falei com ele e ele me disse 'Marcelo, o Dortmund é o time do meu coração, é o lugar que no futuro eu espero trabalhar. Então não posso dizer para você não ir, mas também não vou dizer para que vá. Mas sei que é uma oportunidade única e entenderia se você fosse', assim disse.
Pergunta - O Sebastian Kehl é muito presente nas academias?
R: "Ele é um ídolo do Dortmund. Na academia não vejo ele com tanta frequência, mas está sempre presente no clube, eu o vejo bastante no campo, quase todos os treinos. Sempre observando, conversando com os jogadores e com o treinador no pós-treino."
Pergunta - Como você vê a política de contratação do time no que se diz respeito mescla de jogadores jovens com veteranos?
R: "O Borussia Dortmund é um time formador, que revela, que é a forma como eles e a maioria dos clubes ganham dinheiro. Mas de uns tempos pra cá, eles vem fazendo uma mescla com jogadores jovens e mais experientes. Temos o Ramy (Bensabaini), o Marcel (Sabitzer), que são mais veteranos e vieram trazer mais experiência e peso pro time como também o Felix Nmecha que não é tão jovem mas veio como uma promessa de reforço. Outros jogadores experientes que o clube manteve foram o Hummels, o Reus, o Süle. Outros jovens talentos podemos citar o Jamie, o Julian, Karim. É importante essa mescla entre jovens e jogadores mais experientes. Só com promessas fica difícil querer ganhar alguma coisa. É preciso ter jogadores que já passaram por disputas de grandes títulos, torneios, e que trazem essa vivência e experiência pros mais novos”.
Pergunta - Os brasileiros são muito lembrados em Dortmund, como muitos fazem parte do time de Legends, como você acha que o clube vê os jogadores brasileiros?
R: "Eles falam muito bem aqui dos jogadores brasileiros. O Dede por aqui é muito querido, falam bastante dele, inclusive ficamos de nos encontrar em algum momento próximo. Eles dizem 'faz muito tempo que não temos um jogador brasileiro', sempre gostaram muito e tiveram sucesso com jogadores brasileiros que aqui passaram. Seria bom, realmente, de ter algum 'brazuca' ou até mesmo sul-americanos."
Pergunta - Como é atmosfera do Signal Iduna Park?
R: "É impressionante a atmosfera. É uma coisa que você não vê em muitos estádios, mesmo em estádios cheios... mas o que eu presenciei no último sábado é diferente. Mais de 81 mil pessoas, torcedores de paixão. Isso não é uma coisa que você vê em qualquer estádio."
Pergunta - Como é a violência na Alemanha? No meio do futebol?
R: "Eu nunca presenciei nada. Estive cinco anos em Munique, muitas vezes erámos bem recebidos em outras cidades, uma recepção razoavelmente boa. Não vejo essa 'animosidade' como vemos no Brasil. Eu até conversei com a minha esposa, que no último jogo contra 1. FC Köln vimos torcedores do Dortmund e dos Bodes caminhando juntos. É isso que importa para o esporte, é assim que tem que ser no esporte, não importa para que você torça, você não é melhor ou pior do que o próximo. Sei que há coisas que acontecem por aqui, mas é menor vemos muita das vezes no Brasil. Até porque aqui a punição é muito mais severa... o controle, os estádios possuem câmeras, assim como as ruas. Então assim você passar por uma situação de briga entre torcidas e sair impune a chance por aqui é menor."
Essa foi a entrevista exclusiva com Marcelo Lins Martins. A equipe do Fussball Brasil agradece o brasileiro por ter sido solicito e realizado o bate-papo. Agradecemos, também, você pela leitura e contamos com o seu apoio na divulgação do nosso conteúdo.
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