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Clássicos do Futebol Alemão - Parte 2

Clássicos são um espetáculo à parte. No futebol alemão, são diversos jogos que reúnem grande rivalidade, sejam elas por méritos esportivos, politica ou religião. Por isso, a equipe do Fussball Brasil se reuniu para apresentar 10 grandes duelos, com particularidades diferentes, divididos em dois textos. Confira a seguir os últimos cinco embates! Clique para conferir a primeira parte.

Baden-Schwaben Derby: (Stuttgart vs. Karlsruher)

A rivalidade entre VfB Stuttgart e Karlsruher SC é extremamente quente e curiosa. Ela não surgiu através de disputas de títulos, rixas religiosas ou por “traição” de atletas. Denominado Baden-Schwaben Derby (Dérbi de Baden-Suábia, em tradução livre), o clássico tem origem política territorial. 


O princípio de tudo se dá ainda no século XIX, com a remodelação da Europa dominada por Napoleão Bonaparte. A região de Baden, na Alemanha, foi transformada em Grão-Ducado, enquanto Württemberg em reino. Até aí, mais ou menos tudo bem, embora o povo de Baden não tenha gostado nada nada da decisão. O verdadeiro e maior problema é que, após a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha passou por novas transformações em seu território — o país foi dividido em quatro zonas: norte-americana, britânica, francesa e soviética. 

O estado que VfB Stuttgart e Karlsruher SC hoje fazem parte foi “criado” pelos norte-americanos com os franceses. Inicialmente eram três: Württemberg-Baden (capital: Stuttgart), sob o controle dos norte-americanos, Württemberg-Hohenzollern (capital: Tubinga) e Baden (capital: Karlsruhe), sob o controle francês. Em 1952, as três regiões foram unificadas, transformando-se no que hoje conhecemos por Baden-Württemberg, após votação dos moradores. O povo de Baden foi, em sua maioria, contra a unificação, mas não teve jeito. A cidade de Stuttgart permaneceu sendo capital, enquanto Karlsruhe passou a ser “só” mais uma cidade em meio a tantas. Além disso, apenas 80 quilômetros separam as cidades.

Muito além do futebol, os dois povos realmente se odeiam. É claro que, hora ou outra, a rixa chegaria aos campos de futebol, especialmente porque, durante muito tempo, no século passado, VfB Stuttgart e Karlsruher SC figuravam a elite e tinham grandes jogadores em seus plantéis. O VfB levou a melhor na maioria das vezes que se enfrentaram: 57 jogos, 33 vitórias dos Suábios, 11 empates e 13 vitórias dos Badener. Pela escassez de participações do KSC, na elite do futebol alemão, nos últimos anos, o nome Baden-Schwaben-Derby passou a ser atribuído, também, aos jogos do Stuttgart contra outras equipes pertencentes ao lado Badener, como Freiburg e Hoffenheim, mas nada se compara ao embate entre VfB e KSC.

Baden-Schwaben Derby (Foto/Reprodução: DPA)

Hamburger Stadtderby: (Hamburgo vs. St. Pauli)

Por: Samuel Novaes

O Derby de Hamburgo, formado por Hamburgo SV e FC St. Pauli, é um dos clássicos mais quentes da Alemanha. Com 96 anos de idade, a rivalidade entre as duas equipes da segunda maior cidade do país pode ser definida por dois aspectos: o geográfico e o ideológico.

Identificado com as minorias, o St. Pauli é o elo fraco do Derby. Sem nunca ter conquistado um título, a equipe do porto representa a luta dos desfavorecidos, enquanto o Hamburgo, com cinco títulos nacionais e uma Liga dos Campeões, representa o poder, a riqueza e, consequentemente, os ricos e poderosos. O clássico coloca, frente a frente, dois mundos completamente distintos. De um lado: a glória e o sucesso; do outro: os ideais e os valores de um clube que ganha mais fora do que dentro das quatro linhas. 

Sem se enfrentarem desde 2011, as equipes voltaram a duelar em 2018, quando o Hamburgo caiu para a 2. Bundesliga pela primeira vez na sua história. Os dinossauros, como são chamados os torcedores do HSV, levam ampla vantagem no confronto com Os Piratas, apelido dos adeptos do FCSP. São 59 vitórias dos dinossauros, contra 20 triunfos dos piratas, em 93 confrontos. O duelo político entre Hamburgo e St. Pauli não pode ser entendido como um embate entre um time progressista e outro conservador. St. Pauli e Hamburgo é, na verdade, um confronto socioeconômico.

Sven Brux, um torcedor do time do porto, definiu muito bem o Derby de Hamburgo (mesmo sem citar o seu maior rival), em entrevista dada a CNN. Ao falar sobre a bandeira pirata, marca registrada do clube, Brux disse: “É um símbolo: nós, os pobres, somos contra os ricos, clubes ricos como o Bayern de Munique. Como piratas que lutam pelos pobres contra os ricos”. Hamburgo e St. Pauli é um embate de classes e de ideais transportado para o campo. A sociedade, a política e o futebol estão ligados e não há como negar.

Hamburger Stadtderby (Foto/Reprodução: DPA)

Frankenderby (Nuremberg vs. Greuther Fürth)

Por: Jonathan Gonçalves

Sendo o clássico mais vezes disputado em toda Alemanha, com 266 partidas jogadas desde 1904, o Frankenderby, entre 1. FC Nürnberg e Greuther Fürth, é o mais relevante da região de Franken, também conhecida como Frankenland, na Baviera, sul do país. Outras equipes da região, também promovem clássicos "Francos", clubes como Würzburger Kickers, 1. FC Schweinfurt 05 e SpVgg Bayreuth possuem suas tradições regionais. Mas engana-se quem pensa que a rivalidade entre as cidades de Nürnberg e Fürth nasceu no futebol e nas torcidas dos clubes, pois há relatos que desde a idade média já haviam situações adversas entre os povos locais. 

No início do século XX, um grande atrito econômico resultou em tentativas de fundir as duas cidades em uma, mas a maioria das populações votou duas vezes contra essa ideia. Um famoso historiador alemão, Adolf Schwammberger disse uma vez: “A distância entre Nürnberg e Fürth tem apenas um passo, mas a distância entre as cidades não pode ser medida em quilômetros”, citou. Atualmente, existem pouco mais de 13 km entre o Rondof Sportpark Ronhof, de Fürth, e o Max Morlock Stadion, de Nürnberg, que pode ser feito em menos de meia hora. 

O clássico era visto como o maior do futebol alemão no início do Século XX. O Nürnberg é elo forte deste evento, já tendo conquistado o Campeonato Alemão por nove vezes, cinco desses títulos em um curto período de tempo em: 1919/20, 1920,/21, 1923/24, 1924/25 e 1926/27. A hegemonia do Der Club sempre foi atrapalha pelos rivais Kleeblätter -  Alcunha do clube em alusão ao trevo-de-três-folhas no escudo do clube. Na temporada 1927/28, O Greuther Fürth interrompeu pela segunda vez uma sequência de títulos dos rivais e conquistou seu terceiro - e até então último -  titulo do Campeonato Alemão. As outras duas conquistas em questão foram nas temporadas de 1913/14 e, interrompendo pela primeira vez os rivais, em 1925/26.

Com a ascensão das equipes no início de suas fundações e, posteriormente, na conturba e lamentável era nazista, os dois clubes cediam muitos jogadores para a Seleção Alemã. Em 1924, um amistoso contra a Holanda, todos os jogadores da Nationalmannschaft eram provenientes das duas equipes. No começo, os jogadores não queriam dividir o campo com seus rivais, mas foram compelidos pela DFB. No final, derrotaram os holandeses pela primeira vez, com Heinrich Träg, do Nürnberg, que assistiu Karl Auer, do Fürth, na vitória por 1 x 0. Os jogadores do Nürnberg se recusaram a participar das comemorações dos gols, enquanto os jogadores do Fürth comemoraram entre si. Eles até viajaram para Amsterdã em vagões de trem separados e não se falaram nos vestiários. 

Na temporada 2011/12, o Greuther Fürth subiu pela primeira vez para a primeira divisão desde que a Bundesliga foi estabelecida. Entretanto, o primeiro Frankenderby da era Bundesliga ocorreu em Fürth em 24 de novembro de 2012, pela primeira vez na elite do futebol alemão desde a temporada de 1962/63, há cerca de 49 anos. Embora nenhuma das equipes estejam vivendo momentos, particulares, áureos como na década de 20, o clássico ainda é muito fervente e produz forte emoções aos aficionados pelo futebol alemão. Ambas as equipes encontram-se na segunda divisão, e no último dia 13 de junho de 2020, o Greuther Fürth venceu o Nürnberg por 1 a 0, complicando a vida do Der Club que, momentaneamente, está na zona de playoff de descenso à 3. Liga. De acordo com dados coletados no Wikipedia, são 139 vitórias do Nürnberg, 48 empates e 77 vitórias do Greuther Fürth. 

Os nervos sempre à flor da pele no Frankenderby (Foto/Reprodução: Bundesliga)

Münchner Stadtderby (Bayern de Munique vs. 1860 Munique)


Hoje o FC Bayern München é de longe o maior e mais bem sucedido clube de futebol da Alemanha e vem rivalizando principalmente com o Borussia Dortmund. No entanto, além da considerável rivalidade com o 1. FC Nürnberg, o Bayern sempre teve o TSV 1860 München como tradicional rival. O Derby de Munique é um dos clássicos da Alemanha com mais jogos disputados: são 205 confrontos, 105 vitórias do Bayern, 49 do 1860, além de 51 empates. Se hoje as equipes vivem momentos completamente opostos, basta voltar no tempo para se notar que por muito tempo a disputa foi equilibrada.

Nascidos no mesmo bairro, em Giesing, os clubes dividiram estádios, se revezaram no topo do futebol da cidade e também tiveram vários jogadores - e até mesmo torcedores - em comum. Nos primórdios, o TSV 1860 fundou seu departamento de futebol em 1899. Um ano mais tarde foi a vez do FC Bayern. Do ínicio do século XX até o período Nazista, em 1933, os rivais se firmaram como clubes importantes e estiveram em patamar muito parecido.

O período nazista foi determinante na história do confronto. O Bayern, clube da comunidade judia de Munique, foi amplamente perseguido pelos nazistas e sofreu forte repressão. O 1860, visto como um clube mais humilde e de operários, foi o escolhido pelo partido para fazer frente aos vermelhos. Os Leões, em grave crise financeira, tiveram benefícios durante o regime nazista como melhorias no CT e a reforma do Grünwalder Stadion. Foi justamente nesta época, em 1942, que o Sechzig - ou Sessenta, em português - conquistou seu primeiro título de DFB-Pokal.

Os anos 60 foram os mais equilibrados do Derby: O 1860 conquistou mais uma DFB-Pokal e a Bundesliga em 1966, enquanto o Bayern levou o Campeonato Alemão duas vezes, a Copa da Alemanha em três ocasiões e também a Recopa Europeia. Os jogos entre as equipes sempre eram sucessos de público e há quem diga que a torcida dos azuis foi por muito tempo a maior da cidade.  Da década de 70 em diante, o TSV 1860 passou por problemas financeiros e decaiu, abrindo espaço para a grande geração do FC Bayern, que comandada por Franz Beckenbauer - torcedor do 1860 na infância e sócio vitalício do clube - e Gerd Müller, conquistou tudo, elevando completamente o patamar da agremiação e tornando-os de vez como o maior clube de Munique.

O 1860 só voltaria à elite na década de 90 após grande reestruturação. Por lá, jogou até 2004 e pôde reviver o Derby, desta vez no Olympiastadion, em várias ocasiões. O Bayern foi amplamente superior no período, mas as vitórias mais marcantes dos duelos foram dos celestes. Desde o rebaixamento do TSV em 2004 as equipes só se enfretaram uma vez, na DFB-Pokal em 2008, onde o Bayern levou a melhor com um gol polêmico no último minuto da prorrogação. Foi nesta época que as agremiações dividiram a Allianz Arena, mas devido a um escândalo de corrupção e grave crise financeira, o 1860 se viu obrigado a vender sua parte do estádio para o maior rival.

Se os clubes se enfrentam raramente nas últimas décadas, coube aos torcedores acompanharem os clássicos na Regionalliga Bayern. Até 2016, 1860 München II e FC Bayern II se enfrentaram e pararam a cidade por diversas ocasiões. Apesar de disputados pelas equipes sub-23, o Grünwalder Stadion ficava lotado frequentemente e a polícia tinha de montar operações dignas de partidas de Bundesliga devido a gigante tensão entre os fãs de ambos os clubes. Com mais uma decadência dos Leões nos últimos anos, o time principal do 1860 vem enfrentando o Bayern II e mantendo o clássico vivo. As disputas em campo estão muito longe dos grandes holofotes, mas tanto pra azuis como pros vermelhos está claro: a rivalidade existe e é gigante.

O brasileiro Zé Roberto na disputa de um Münchner Stadtderby (Foto/Reprodução: Getty Images)

Nordderby (Hamburgo vs. Werder Bremen) 


Apesar de ambos os times não viverem uma boa fase dentro dos campos, com o Hamburgo disputando a segunda divisão alemã e o Werder Bremen à beira do rebaixamento na temporada 2019/20, não se engane, pois sempre que as duas equipes entram em campo, a rivalidade prevalece e o espetáculo sempre agrada. 

Sendo um dos clássicos mais antigos na elite do futebol alemão, o Nordderby é marcado por ser um embate entre duas das maiores cidades e polos econômicos do norte da Alemanha e, também, por um enorme equilíbrio histórico nos confrontos, sendo 58 vitórias para Os Papagaios, 53 triunfos para Os Dinos e 43 empates no total. 

Apesar da fase ruim vivida por ambas as partes do confronto, outrora o clássico já foi marcado por ser um jogo de alto nível, com  as equipes sendo multicampeãs da Bundesliga e da DFB-Pokal, com o Hamburgo tendo sido campeão, inclusive, da UEFA Champions League na temporada 1982/83. 
Como o nome do próprio confronto sugere, o Nordderby tem um grande papel na rivalidade regional para ver quem é a melhor equipe do norte, as cidades, também, disputam economicamente, sendo a cidade de Hamburgo mais ligada ao porto da cidade, um dos maiores do mundo, como principal forma de renda, e a cidade de Bremen desempenhando um papel mais industrial, como na produção de asas para os aviões Airbus e de outras fábricas, como a Mercedes-Benz e a sede da Borgward.

Em suma, tanto dentro como fora de campo, a rivalidade do Nordderby é enorme e mágica e para a tristeza de todo e qualquer amante do futebol, ambos os clubes não se enfrentam desde 2018, quando o Hamburgo foi rebaixado para a segunda divisão da Alemanha. Seguiremos na torcida para que as duas equipes voltem a se enfrentar em um futuro próximo e voltem a nos proporcionar partidas recheadas de emoção, como sempre fizeram no decorrer da história.

Nordderby (Foto/Reprodução: Cathrin Müller/Imago MIS)

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